segunda-feira, 15 de agosto de 2011

A primeira das histórias sobre João Ninguém

João ninguém nasceu em mais um dia desses sem identidade. Um dia comum no mundo, cheio de coisas especiais e tragédias genuínas. Completou um ano de idade num dia desses considerados de azar por alguns supersticiosos. Cresceu e foi vivendo a vida assim, levando um dia após o outro. Se não me recordo de muitas coisas especiais em sua trajetória, a qual acompanhei com olhos atentos através da fechadura de uma porta, talvez a razão seja que ele não os tenha tido. Mas viveu, sim. E algumas coisas marcaram.
Acontece que João sofreu muito no decorrer de um período em sua vida. Talvez sua sensibilidade tenha feito com que sofresse mais que uma pessoa considerada comum. Bem ele, que era João Ninguém. Sobrenome que marcou sua vida e fez com que se lembrasse de sua condição durante muito tempo. João Ninguém. Ninguém, João.
João teve diversos problemas durante sua adolescência. Era tachado de bobo na escola. Sua timidez sempre o impedira de ir um pouco mais além, mostrar seu verdadeiro potencial. E era também diferente das demais crianças. Sempre se importara muito em conseguir dar o melhor de si. Fosse aos estudos, amizades, na família, na aparência, no amor. E buscara sempre conseguir chegar, ao menos, perto de alcançar a perfeição.
Ao terminar o ensino médio, João viveu sobre a constante pressão de conseguir se encaixar em alguma coisa que lhe proporcionasse não apenas um futuro agradável, mas também algo que fosse capaz de suprir suas necessidades do coração. Para ele, importava mais viver daquilo que amava. Mas o que é que amava? Nem ele sabia. E no meio de toda a confusão entre procuras e procuras, João encontrou uma coisa que talvez fizesse sentido. Encontrou por influência externa, mas encontrou. Infelizmente, tal coisa me é um assunto assim, discretamente proibido.
Durante sua pacata vida louca de alguém chamado Ninguém, João (assim como todas as demais pessoas) se apaixonara algumas vezes. Para sua infelicidade, nada que fizesse algum sentido real, ou fosse capaz de preencher todas aquelas lacunas que só outro alguém é capaz de colorir. Então João amava, se arrependia, e depois olhava para tudo como pensando que tivesse sido apenas mais um daqueles sonhos longos. Quando ele acordava, não restava mais nada, apenas vagas lembranças.
De qualquer forma, acredito que não se possa comentar sobre os amores de João sem citar o momento em que ele encontrou uma menina. É claro que a história do sonho aconteceu, como com todas as outras. Esta, porém, mexeu com alguma coisa diferente dentro dele. Era uma menina que aparentava estar sempre calma, apesar de sua eterna inquietude. Ela tinha lá seus problemas na vida, estando a maioria localizada dentro de si. Problemas internos, assim como João. Dizem por ai que aqueles que vivem na eterna busca pela perfeição são os que mais sofrem. Enfim, as coisas, como sempre, deram errado para João Ninguém. Ele e a menina bonita nunca mais se viram. Mas João aprendera muito no tempo em que esteve com ela, ainda mais no tempo em que sentira o peso de sua ausência. Tempo breve e profundo, diga-se de passagem.
Termino aqui então escrevendo sobre algumas das lições de João. A maior delas, sem dúvidas, foi descobrir que ele não era tão ninguém assim. Todo mundo é alguém a partir do momento em que faz falta na vida de alguém. E mesmo longe, a menina também se lembrou dele no decorrer de várias noites. Algumas até mesmo sem dormir. João também finalmente aprendeu com seus erros. Parou de tentar ser perfeito o tempo todo. Entendeu que a vida é imperfeição, e que a verdadeira perfeição deve apenas ser imperfeita. Esta é a regra do mundo. E que no meio de tanta gente, um simples sorriso ou gesto de amor tira a condição de alguém passar despercebido. Entendeu que as coisas pequenas são as que realmente valem a pena, nada além. E que quando se tem tudo, não se deve jamais sentir falta daquilo que não está presente. João entendeu que se deve amar aquilo que existe ao seu redor. E que se deve amar as pessoas que o amam também. Valorizar. João aprendeu tanto, mas tanto. Aprendeu tanto, que ao olhar pro seu interior, descobriu o bem que ele poderia ser. E passou a dedicar o resto de seus dias a tentar melhorar alguma coisa em si, sempre. Jamais buscou novamente a perfeição, apenas tentou fazer com que os dias de todos que se encontravam presentes em sua vida valessem um pouco mais a pena. João aprendeu a amar. E depois viveu todos os seus dias se lembrando de que ser Ninguém não lhe era mais que apenas uma opção. E que tudo, um dia, tudo volta para o seu lugar. Só depende do tempo e de cada um. E então, em paz, João encontrou seu próprio destino. Assim, sempre como quem não quer nada e anda um pouco distraído...

Um comentário: